A história das palavras terminadas em -ão e -ãos, -ães, e -ões...Tinha passado eu de visita por Terras da Porcalhota, em altura das festividades dos nossos Santos Populares, onde não faltou nem a pinga nem a sardinha assada, e o cheiro dos manjericos quase não se distinguiam por entre o denso fumo dos chouriços assados, quando me deparei com a D. Marta, Viscondessa da Reboleira (ou será da Rebaldaria?...De momento falha-me a memória, mas porei tal questão a limpo, e em breve!...).
Como dizia eu, entre sardinhas a escorregarem do pão de trigo, apetitoso, e os dedos engordurados a segurarem os cálices de tinto vinho, decidiu a D. Marta, senhora digna e fiél à sua Corte, e òptima companheira de serões ìntimos, apertar os cordõezinhos do seu espartilho, que por razões desconhecidas descaía atrevidamente, refiro-me ao espartilho, claro!
Foi então neste teor, e no meio de tal festejo, que a questão se pôs...Serão cordõezinhos ou cordãozinhos?...'Agora é que vão ser elas!...', pensei eu para com os meus botões, que naquela altura bem podiam ser botãos!... Eu estava mortinho por ver umas destas acontecer!... Serão cordãozinhos ou cordõezinhos?...
Ora, se temos um botão, um balão, um corrimão, um feijão, um garrafão, um pão e um capitão, então será que o plural de botão é botãos?...ou será botães?...sim, porque também se diz capitães, e não capitões, mas depois também temos a questão dos balães, ou serão balãos?...Ás tantas é balões, o que pode dizer que afinal os botães sejam botões, e os pães sejam pões, a não ser que sejam pãos!...Com esta confusão toda já estou tonto, e o melhor é agarrar-me aos corrimão...não, espera, acho que é mais do que um (ai o vinho!…), e então são corrimães!...mas se os botões não são botãos, então talvez os corrimãos sejam corrimões, e com isto pássa-se o tempo e vem o S. João, que há só um, valha-nos ao menos isso, e por isso não temos cá Joães nem Joões, se houvesse mais seriam Joãos, mas não há, graças a deus!...E então é assim que o João nos trás um balão, ou dois balães, quero dizer, dois balões!...Espera lá, então se é balões e pões, desculpem, quiz dizer pães, ou será mesmo pãos?...Ai que confusão, ou confusãos, que isto agora está a ficar muito mais complicado do que eu pensava, e eu que detesto confusões!...
Recapitulemos, então, que eu assim vou abotoar os meus botões, o balão leva o S. João, para o juntar aos outros balões, e eu, com a brincadeira, seguro-me ao corrimão, que já não sei se é só um, ou se é a minha vista que me engana e me faz ver dois corrimões!...Ainda dou um trambolhão, ou uns trambolhões, dependendo do vinho que já bebi nesta noite de S. João, que não sei se bebemos de garrafa ou de garrafão, mas dizem as más línguas que já bebemos demais e que foram dois garrafões, e era tinto carrascão!...
Depois do vinho e dos trambolhões, o melhor é parar nesta tasca e comer um prato de sopa de feijão, que em tascas como essa não se serve camarão, nem sopa de camarães (que, ás tantas são camarões, não querem lá ver?!), ou uma pratada de feijões com arroz, para ensopar o tintól...
E depois, o melhor é sair de mansinho, do meio desta confusão, ou serão confusões?...Não venha ainda aí a Real Guarda do Reino, com os seus capitães, que não são decerto rufiões com quem se meta gente séria, e ála daqui para a Padaria, que a esta hora já o cheirinho sai dos fornos quentes, e podemos nós curar a ressaca com um pão quente, um mesmo uma meia arroba de pães, para ensopar mais a vinhaça que se bebeu nas últimas horas!...E cuidado para não caírem!Abotõem esses atacadores, ou cordõezinhos dos espartilhos, e arredem daqui para fora, que já amanhece, e são quase horas de comer outra vez!...

A sardinha assada nada tem a saber, a não ser que deve ser adquirida fresca e riginha, ou tesa, como dizem nas minhas cozinhas, de olho vivo e sem estar amachucada, nem muito mexida. A sardinha não se estripa nem se escama, salpica-se com sal grosso, de mar, e vai à grelha quente, que se encontra em cima de um bom braseiro de carvão. Não demora muito a assar, na grelha, mas há que ter atenção ao fogo que saltará sem dúvida, devido à gordura da sardinha. Nada que uma simples malga de água, bem à mão, para salpicar a labareda, não possa controlar!... Quem não souber assar umas sardinhas na brasa, simplesmente temperadas de sal, não é de digno de pertencer a esta nossa Lusa Terra, desculpem!...Quanto ao chouriço, que geralmente é de carne, e ás vezes também de vinho, se bem que se possa fazer o mesmo com a Morcela, apenas necessitam, estes ricos enchidos, uns cortes laterais, não muito profundos, e são simplesmente postos na brasa, mas não onde está a sardinha, porque esta, atrevida como é, fará o chouriço saber ao mesmo que ela!
Assado o chouriço e a morcela, é então cortado aos pedaços e servido no pão, com uma malga de vinho, assim como a sardinha.
Quanto ao pão, o Saloio seria o favorito, e o preferido, servido em fatias grossas, para o dito poder recolher o saboroso suco da sardinha. No entanto, à falta do Saloio de Mafra, pode-se optar pelo de centeio, trigo, ou milho, que é o mais seco de todos. O que interessa é que seja pão artesanal, e não uma dessas porcarias a que se pretende chamar pão, geralmente branco e de forma, todo mole como a borracha, vendido em sacos de plástico, e com um prazo de validade de três anos e meio...Se não sabem do que é que eu estou a falar, talvez ainda não tenham sido violados por algum, mas se os virem, fugam, que aquilo não é pão!...Se não têm a certeza, procurem a lista dos ingredientes, no saquinho de plástico, que deve ser uma longa lista, e se encontrarem mais do que farinha, água, sal, fermento ou levedura, e talvez azeite, então não é mesmo pão!...Simples!!!
Hoje em dia há quem faça coisas, a que chamam pão, que eu não daria nem de comer aos ratos, e por duas razões, primeiro porque não se dá porcaria aos animais, e segundo porque eles não o comeriam!...São ratos mas não são estúpidos!...Já não se pode dizer o mesmo de quem come desse rico 'pãozinho', e gosta!...
Pronto, agora que já sabem acerca do pão, comprem lá umas sardinhas, uns chouriços e umas morcelas, um bom pão saloio, fresco, e um garrafão de vinho, digno de um festim decente, aqueçam essas brasas e toca a festejar, que as coisas mais simples, muitas vezes, são as mais delicadas e saborosas!...
Bom Apetite!
Deste vosso sincero,
CBC